terça-feira, 10 de julho de 2012

Um dia no metrô de Paris ou Sobre como reconhecer parisienses

“Com licença”; “Com licença, me desculpe”; “Alguém pode abrir a porta, por gentileza?”; “Ei! Espere as pessoas descerem, senhor!”; “Alguém pode abrir a porta, por gentileza?”; “Com licença, me desculpe”...

A essas poucas frases alguém poderia resumir um dia no metrô de Paris. E é assim que um parisiense faz. Porém, há muito mais, para aqueles com uma pontinha de curiosidade. Por exemplo, há um homem engravatado – já próximo da meia-idade – que lê jornal por cima dos ombros de uma ruiva. Concentrado, ergue um pouco a cabeça e baixa os olhos, ainda olhando por cima do ombro da garota. Não parece mais interessado em leitura.

A menina, parisiense; ele não. Porque parisienses não veem ninguém, no metrô. Olhos perdidos, às vezes parecendo contar as luzes do túnel; Smartphones que mostram Angry Birds sendo lançados para derrubar obstáculos; Fones de ouvido lhes permitem esquecer o que se passa ao redor.

Um senhor me pergunta: - E você, não tem? Ao ser questionado sobre a razão da pergunta, aponta para os jovens ao redor, todos com orelhas cobertas com fones Beats, do rapper Dr. Dre, e outras marcas diversas. Digo que não sou parisiense, e ele compreende.

Mesmo se você, leitor, não puder notar isso, durante suas viagens (passadas ou futuras) a Paris, basta saber de uma coisa: quem não é parisiense, curioso é. Costuma olhar para tudo e todos. Comenta sobre o quanto faz calor no trem, ao que o parisiense responde com um sorriso amarelo, para em seguida voltar a ler. E preciso deixar claro: não falo de pessoas nascidas nos 20 distritos de Paris, pois isto não é suficiente. “Sou parisiense há cinco anos”, disse-me certa vez uma colega de Bordeaux.

Já o namorado de uma amiga, rapaz louro natural do sexto distrito, ouve-me dizer que achava engraçado ver os parisienses paquerarem no metrô e reage prontamente, parecendo estar incomodado: “Não são parisienses. Parisienses nem sequer olham para os outros, na rua. Nós somos educados assim. Esses são caras da periferia que vêm a Paris, à noite”. De vez em quando, essas frases se repetem em minha cabeça, quando estou no metrô.

Uma garota me observa atentamente há uns cinco minutos. Ela pensa que não percebi, mas sim. É bonita, como muitas das marroquinas, mas, na verdade, não chega a tirar minha atenção de outra pessoa no vagão. No momento, vejo um rapaz bem vestido que parece ser estagiário, como eu. Desde que subi no trem, ele joga em seu iPhone. Comum. Incomuns são seus olhos, que parecem piscar ao menos quatro vezes por segundo. Quando começo a fazer igual, desvio os meus. É engraçado.

O senhor que me perguntou sobre os fones de ouvido continua ao meu lado. Conta, com seu sotaque da ilha da Reunião (Departamento Ultramarino da França), que uma garota (com fones de ouvido) não percebeu quando um rapaz esperou os últimos segundos antes do fechamento das portas do metrô para tentar roubá-la. O homem da ex-colônia francesa, de aproximadamente 1,90m, havia notado desde o início, e pegou o rapaz franzino pelo pescoço, fazendo-o soltar o smartphone de última geração. Ele me diz que presta atenção a todos, do metrô, mas que as pessoas de Paris devem ter um problema: não olham para ninguém.

quarta-feira, 25 de abril de 2012

Poliglota

Em um desses domingos ensolarados de primavera, saio com amigos, por volta das 11h, para tomar café da manhã na lanchonete da Cité U. Sei que é tarde para a primeira refeição do dia, mas o fim de semana permite. Ao menos alguns se permitem, e contarei o porquê.

É que, na volta, cruzamos com um rapaz louro, alto e de olhos azuis, daqueles que costumam acordar às 14h, no domingo. No entanto, ele leva consigo uma bolsa tiracolo, sinal de quem vai trabalhar ou estudar. O relógio marca meio-dia.

– Bom dia. Com licença, vocês moram na Maison du Cambodge? – pergunta. Após resposta positiva, questiona se poderia, por acaso, estudar na nossa biblioteca. – É que a da Maison International (prédio principal da Cité) só abre às 13h e eu gostaria de começar a estudar logo – diz, demonstrando uma timidez ingênua.

Prontamente, dizemos sim. Para um estudante que não se esforça tanto, é a oportunidade de se ver em outro que trabalha no domingo (pelo menos isso). Até então, conversávamos em francês. Ao saber que minhas amigas eram de Barcelona, não hesita em falar espanhol. Quando digo “no hablo muy bien español; soy brasileño”, ele passa ao português. Pareceu-me que tinha reencontrado um velho amigo. Como bom nordestino, fico encabulado.

– Rapaz, que idioma você ainda vai falar? – pergunto. Com mais vergonha que eu, ele diz: – Minha língua materna é o flamengo (como os belgas costumam chamar o neerlandês de lál), e também falo inglês e alemão. É que quero ser diplomata.

Depois de saber que, com 23 anos, esse belga fala neerlandês, francês, inglês, espanhol, português e alemão, você ainda seria capaz de duvidar de que ele conseguirá?

domingo, 4 de março de 2012

Sartre e Simone de Beauvoir na Cité U


Viver na Cité internationale universitaire de Paris é saber que há uma história de quase 100 anos de encontros e desencontros. É ter consciência de que mais de 140 nacionalidades estão representadas em uma pequena cidade com mais de 5.000 habitantes. Seria uma Babel, se não houvesse um verdadeiro intercâmbio entre esses estudantes, artistas e atletas. E, como se tudo isso não fosse suficiente, Sartre e Simone de Beauvoir ainda podem ter vivido seu amor por essas ruelas.

Após conhecer Sartre na Faculdade de Letras da Universidade de Paris, De Beauvoir teria vindo à Maison Deustch de la Meurthe visitá-lo. Uma cerveja, um cigarro. Andando pelas ruas da Cité U, observo a noite de lua crescente e os galhos das árvores, que balançam esperando a primavera. Pergunto-me se esses antigos moradores se deram as mãos para flanar por esses mesmos lugares. Sou feliz.

segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

Estudar na França no período 2012-2013

Os colegas que pensam em estudar na França no período 2012-2013 devem realizar o quanto antes as candidaturas. Vale a pena lembrar que, caso você sonhe que uma bolsa, os programas aceitam inscrições até abril, normalmente.

Veja algumas oportunidades:

Bolsas de 1.000 euros para mestrado na École Normale Supérieure de Lyon. É uma excelente quantia.

Para os que não falam francês, oportunidades no Instituto Politécnico de Grenoble para cursos na área de Tecnologia. http://www.comunidadefb.com.br/web/index_not.php?p=8644

Sciences Po. Esse nome abre muitas portas, tanto na França quanto em outros países. Inscrições abertas. http://www.comunidadefb.com.br/web/index_not.php?p=8468

Confiram sempre o site da Comunidade França-Brasil, sempre aparecem oportunidades interessantes.

sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

Champagne para confortar minha saudade

Fotos por Pedro Miguel

Como escrevi na postagem “Enfim, férias ou Enfim, trabalho”, decidi ir a Reims (soa mais ou menos como “rãs”), na região de Champagne-Ardenne. Viajei na quarta-feira a convite de um colega de classe, que me ofereceu teto. Começo desastroso, final charmoso. Quem disse que é fácil chegar ao paraíso?

Na preparação, como sempre, deixei para arrumar minha mala tarde, por volta de meia-noite. Dormi às 3h para acordar às 6h30 e pegar o TGV (trem de alta velocidade) às 8h08. Resultado: ao sair de casa, às 7h30, confiro o bilhete novamente e vejo que, na verdade, o trem partiria às 7h58. Corri o máximo que pude para tentar chegar à Gare de l’Est a tempo. Cheguei às 7h58, mas TGV não atrasa (bem, é muito raro). Merde.

Catedral de Reims é mais bonita que a Notre Dame parisiense
Recebo reembolso de metade do valor pago, compro outra passagem. Parece que cheguei atrasado somente para poder comprar a última edição da Vogue francesa (Kate Moss na capa) para uma amiga. Infelizmente, não tinha a Playboy France para outra.

Após subir no trem, chego a Reims, que fica a cerca de 130 km de Paris, em menos de uma hora. Gente bonita nas ruas, um pouco mais frio que Paris (fazia 5ºC, sensação térmica de 0ºC) e uma belíssima catedral de Notre Dame (mais bonita que a homônima parisiense).

Pego minha câmera para fazer umas fotos e percebo que esqueci o cartão de memória. Putain. Compro um de 4 Gb por 15 € (R$ 40). Mais caro se comparado a Paris, mas, mesmo assim, mais barato que no Brasil.

 Vale a pena conferir os vitrais

Volta pela cidade, vinho em um restaurante e retorno para a casa do meu colega, com algumas Heineken e La Chouffe, excelente cerveja da Ardenne belga. No Xbox, Brasil perde para a França três vezes por placares elásticos. Oh, la vache !

No dia seguinte, após noite de poker e filmes franceses com os novos amigos rémois (gentílico para os nascidos em Reims), faço todo o tour obrigatório, passando inclusive pela basílica onde Clovis, o primeiro rei da França, foi batizado por Saint Remi.

Champagne

G.H. Mumm é fabrigado desde 1827

Mas o ápice da viagem foi minha visita ao G.H. Mumm, um dos mais charmosos champagnes, com uma história que remete ao século 19. O slogan é Seulement le meilleur (Somente o melhor), pelo padrão de qualidade exigido desde 1827, quando a marca foi criada. Também é a bebida oficial da Fórmula 1, o que, de certa forma, contribui para aumentar o prestígio.

Aproveito cada gotinha da degustação me perguntando quando teria a oportunidade de beber algo assim novamente. "Infelizmente, Pedro, é improvável". Na saída, vou ver os preços só para poder rir um pouco. De fato, ri bastante, mas de felicidade!

Havia degustado uma das versões mais caras do G.H. Mumm, o Brut Grand Cru. No Brasil, custa algo em torno de R$ 400, R$ 500. Em Reims, 42,50 € (R$ 100). Ah, como é bom comprar produtos diretamente ao fornecedor. Presente de ano novo para confortar minha saudade.

Meu conforto para o réveillon

segunda-feira, 26 de dezembro de 2011

Um Natal francês

Primeiro Natal longe de minha família. Por outro lado, pude conhecer o modo francês de festejar a data, sem dança, cantorias e abraços à meia-noite, mas com Papai Noel, muito foie gras (fígado de pato), queijos, vinho e champanhe.

Convidado por uma colega de classe para passar o Natal com a família dela, eu aceitei de pronto. Não poderia desperdiçar a oportunidade de saber in loco como se comemora esse dia na França, apesar de já me terem falado bastante sobre isso antes.

Por volta das 20h30, chego a Massy, cidade da região metropolitana de Paris, e gosto do que vejo. Nada de ruas cercadas por prédios sufocantes, cheias de bares e restaurantes e com trânsito movimentado. O que vejo é um ambiente bem familiar e agradável. Casas grandes, muito verde, luzes e enfeites nas janelas...

Apesar da data especial, o silêncio impera. Nem sinal de músicas natalinas e muito menos de Simone entoando “Então é Natal...”. Pergunto-me qual era mesmo o número da casa, mas logo vejo a inscrição ao lado da campainha: Provasi. É, este não é um sobrenome francês, mas é a cara deste país multicultural.

Explico rapidamente: Minha colega tem avó italiana (razão do sobrenome Provasi), mas nascida na Argélia. Entre os filhos dela, já franceses, está o pai dessa amiga, cuja mãe é dinamarquesa. Vive la France e suas múltiplas origens.
Troca de presentes
 
A casa parece estar vazia, tendo em vista que, no Brasil, ouviríamos a gritaria e a música alta facilmente, mas a porta se abre logo após o primeiro toque da campainha. Ao entrar, vejo mais de dez pessoas que conversam e brincam sem muito alarde e com muito menos álcool.

Após risos e conversas amenas, nós nos sentamos à mesa. Isso mesmo, bem antes de meia-noite. A ceia de Natal é um verdadeiro ritual, o ápice da gastronomia francesa e das regras de etiqueta. Entrada, muita conversa; Prato principal, ainda mais conversa; Queijos, mais risos e conversa; Em seguida, sobremesa acompanhada de conversas diversas. Então, já passara de meia-noite e nada de abraços, cantorias e declarações de amor fraterno. Muito diferente.

Terminada a ceia, chegou a hora do pai de minha colega se vestir de Papai Noel. Ele nunca havia feito isso, foi um esforço a mais pela pequena sobrinha-neta. Foi tão sincero, vi que havia realmente um bonito sentimento ali. Eu poderia escrever umas três páginas somente sobre esse belo momento.

"Você vai ser boazinha?"
 - Você vai ser boazinha no próximo ano?

- Sim.

- Pergunto isso porque me disseram que você vai para o canto, às vezes. Você vai ser boazinha?

- Sim, responde a garotinha, que parecia sentir um misto de medo, surpresa e felicidade.


Com a partida do Papai Noel, percebi que ápice do momento fraterno começava ali, e não necessariamente à meia-noite. Trocas de presentes, belos agradecimentos e, finalmente, música. Bem baixinha, somente para animar um pouco o ambiente. Música brasileira, tentativa de dançar samba. Não conseguiram, claro, mas fiquei feliz em ver como se divertiram. Ainda ganhei uns caramelos e cremes do Mont Saint-Michel, na região da Bretanha. Uma delícia, por sinal.

E a melhor parte viria na chegada em casa: como diz uma amiga brasileira, “moramos no futuro”. Com a diferença de fuso-horário (quatro horas a mais), cheguei em casa a tempo de festejar o Natal com minha família e amigos, pelo Skype. Mais de três horas de brindes, dança, fotos, saudades e “vontade de ter dar um abraço”.

Um Feliz Natal.

domingo, 18 de dezembro de 2011

Enfim, férias ou Enfim, trabalho

Ça y est, c’est les vacances !

Férias de inverno, em Paris. Nada de aulas até o ano novo. Nós chamaríamos de “um breve recesso”, mas os franceses ficam loucos com essa quinzena livre. Para mim, as coisas não mudam muito. Vejo os colegas partirem para os mais variados destinos (Espanha, Suíça, Alemanha, Zimbábue, Ilha da Reunião, Lyon...), e fico. O lado bom: o primeiro trabalho!

Após eu espalhar aos quatro ventos que gostaria de trabalhar durante as férias, uma colega de classe pergunta se eu faria um babysitting. De pronto, digo que sim. A tarefa era simples: os pais de dois garotinhos de 2 e 5 anos queriam sair para divertir e precisavam de alguém para cuidar dos pequenos no período de ausência (entre 20h e 1h deste sábado, 17).

Ganhar 40 euros (100 reais) para ler um livro e começar outro, conversar com amigos pelo Facebook, comer biscoitos com suco de pêra e praticar compreensão oral de francês assistindo às notícias do mundo, tudo isso enquanto as crianças dormem. Fácil como “encabular as amigas com comentários sobre sambinhas”.

Cave na região de Champagne-Ardenne
Os pais ainda me agradeceram. Pensei: - Rapaz, desse jeito, trabalharia todo dia para vocês. Disse: - Obrigado pela confiança.

Para aproveitar o dinheirinho extra, vou a Reims, na região de Champagne-Ardenne, para visitar umas caves e beber... champanhe! Desculpe-me, caro leitor, a vida fácil de estudante tem dessas coisas difíceis, às vezes.

Mais informações sobre Champagne-Ardenne: http://www.tourisme-champagne-ardenne.com/